6.10.08

Retirado de "Mayday- wordpress.com"

Abril 24,2007 by 2007mayday




"Durante muito tempo dei voltas e mais voltas à massa cinzenta, à procura de uma explicação… uma explicação lógica, entenda-se… porque isto de sermos pura e simplesmente todos uns incompetentes não é verdade. E não é verdade, sobretudo, em relação a todos e não em relação a tudo. Então qual o interesse de manter e deixar sedimentar cada vez mais o status quo?
Porquê não dar uma boa formação que para além de completa, de “excelência”, garantisse a entrada no mercado de trabalho? Não só a entrada mas também a continuação, um percurso sem interrupções, um percurso que não fosse uma montanha russa.
Porque é que quando acabamos o ensino básico não temos habilitações para o que quer que seja? Como é possível que os professores digam com toda a naturalidade “só o 9º ano não te serve para nada!”? Se o ensino é obrigatório então pressupõe, obviamente, que a continuação deveria ser voluntária. Será voluntário continuar a estudar, não por vontade, não por gosto, mas porque as alternativas são todas muito precárias?
E seguimos para o secundário. Mas quando terminamos o secundário continuamos sem habilitações para um mercado de trabalho que vá para além dos call centers, do balcão de uma loja de um qualquer centro comercial, de uma qualquer “baixa”, para além de mais uns recibos verdes, ou seja, para além de mais um qualquer trabalho precário… Mas quantos de nós não tinham continuado a estudar para fugir a isso tudo? O que é que nos ensinaram nesses três anos? Ensinaram-nos? Ou mais uma vez foram-nos pondo aos molhos dentro de salas para que lá fora fossem menos a “criar confusões”?
E seguimos para o ensino superior. Mas já não vamos confiantes. E passamos o curso com dor de barriga ou não pensamos nisso e vamos levando com as cadeiras que apenas são mobília da casa. E vamo-nos perguntando vezes sem conta “para que serve isto?”, “porque é que dão isto assim??”. E passamos às cadeiras e vamos esquecendo. Para não ficarmos mais agoniados, para não ficarmos mais deprimidos. E chegamos ao fim. E porque é que uma percentagem cada vez maior de nós, que decidimos entrar num curso superior, para ter uma melhor formação e melhores perspectivas de emprego, chega à conclusão que apenas adiou por 4 ou 5 anos a entrada para o qualquer call center e afins e a entrada para as consultas de psiquiatria por causa de uma depressão? Não era suposto que o ensino fosse “superior”? Superior a quê? Ensino? Ensinaram para quê? Ensinaram?
Porque é que vamos ter que continuar a depender dos nossos pais? E os que não têm pais? E quando os pais se reformarem? E quando os pais morrerem?
Porque é que o orçamento para a educação é definido como um custo, e como um custo que é, na conjuntura actual, deve ser cortado… porque temos que cortar nos custos… Porque manda o Sr. Défice. Mas porquê? Mas porque é que o Sr Défice manda que o percurso escolar dos portugueses seja uma tragédia grega que acaba no centro de emprego? É com esta enorme massa de desempregados e empregados temporários, precários, deprimidos e frustrados, que o país evolui?
Não. Mas interessa que assim seja, porque se assim não fosse não haveria desempregados, ou pelo menos não tantos. Não haveria quem concorresse a empregos com “habilitações excessivas”. Não existiriam pessoas com o secundário, com uma licenciatura, com um mestrado, que aceitassem (muito menos procurassem) um emprego diferente daquele para o qual estudaram, um emprego que não oferece qualquer tipo de estabilidade, qualquer garantia do que vai acontecer amanhã, qualquer perspectiva de carreira. Porque não seríamos mão-de-obra descartável, a ganhar quase nada, a fazer render muito a muito poucos.
E porque esses muito poucos, por enquanto, controlam muito mais quem controla o Sr Défice, o ensino, na verdadeira acepção da palavra não existe, ou existe muito pouco e para muito poucos, a educação é um custo e a escola é uma fábrica de empregados precários em série.
A precariedade do trabalho tem muitas raízes. O sistema de ensino de hoje, como precário que é, é uma delas. A “empregabilidade” é apenas mais uma frase publicitária para vender cursos ou para nos convencer que Bolonha (a Escola-empresa, a venda do ensino, o comando do mercado nas escolhas da investigação, etc.) é a solução. Uma formação completa seria muito mais do que isso: a estimulação da nossa capacidade crítica, o despertar constante para a realidade que se vai construindo à nossa volta, o encorajamento para combater o conformismo, o não aceitar das coisas como elas são, só porque sim, o não ser, apenas e só, mais uma roda da engrenagem. "

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